Os Quatro Milênios da Babilônia, A Morada dos Deuses
Por Claudia de Castro Lima
Em
1987, o então ditador iraquiano Saddam Hussein visitou ruínas de um palácio
que pretendia reconstruir, localizadas 80 quilômetros ao sul da capital Bagdá.
Lá, perguntou ao arqueólogo Donny George, na época diretor de campo do sítio,
como os especialistas sabiam quando o palácio havia sido construído. O
cientista mostrou para o governante os tijolos originais. Neles estava
estampado um nome, Nabucodonosor II , que se sabia haver vivido por
volta de 605 a.C..
Saddam
quase não falou naquele encontro. Mas ouviu muito sobre a história do local. E
fez duas exigências. A primeira era que a reconstrução do palácio começasse num
festival de artes que ocorreria em setembro daquele ano. A segunda, que seu
nome estivesse inscrito em todos os tijolos, assim como Nabucodonosor fizera
mais de 2 500 anos antes.
Ambas
denunciavam a megalomania do ditador. E também o fascínio que a avançada
civilização que por lá floresceu exercia não só nele, mas em toda a humanidade.
A Babilônia, nome tanto de uma cidade quanto de um
império, voltava, assim, a ser o centro das atenções.
Essa
civilização, que surgiu na planície entre os rios Tigres e Eufrates, não foi a
primeira. Antes dos babilônicos, os sumérios já haviam erigido um império na
região conhecida como Mesopotâmia. Várias outras civilizações viveram
sucessivamente por ali: a assíria, a hitita, a acádica. A história delas
começou por volta de 4000 a.C.. "Diferentes grupos populacionais
existentes na Mesopotâmia estabeleceram relações entre si.
Eram
pastores do deserto, pescadores dos pântanos e agricultores das
planícies", diz a historiadora Kátia Paim Pozzer, doutora em História pela
Universidade de Sorbonne, em Paris, e professora da Universidade Luterana do
Brasil.
"Eles
formaram um núcleo de contato com os povos das áreas montanhosas distantes, em
busca de matérias-primas inexistentes no sul da região, como pedra, metal e
madeira. Iniciou-se, assim, um processo de diferenciação social, em que um
grupo conquistou o monopólio sobre a produção de riqueza daquela
sociedade."
Foi
assim que surgiram os primeiros centros urbanos, como Uruk, que tinham uma
instituição principal: o templo. "Os templos exerciam papel religioso, mas
também econômico e administrativo", diz Kátia. Para os mesopotâmicos, as
cidades eram a morada dos deuses. "Cada divindade do panteão possuía uma
residência principal, sua cidade predileta." Babilônia era casa do deus
Marduk, que ocupava posto máximo no panteão.
Na
região, as várias cidades-estados que surgiram foram marcadas pela pulverização
do poder. Disputas sobre a hegemonia política levaram a um êxodo rural. As
cidades eram o lugar mais seguro. Fortes foram construídos, muros subiram ao
redor delas para evitar invasões. As constantes brigas também exigiram o
fortalecimento da autoridade política e militar - e, por isso, surgiram os
palácios.
Período Paleobabilônico
O
primeiro império da Babilônia teve início em uma dessas danças das cadeiras
entre as cidades-estados mesopotâmicas. Depois dos sumérios, que foram o povo
mais influente na região entre 2900 e 2000 a.C., os amorritas ganharam controle
de grande parte da região.
"Eles
centralizaram o governo sob cidades-estados individuais e basearam sua capital
na cidade da Babilônia", diz o historiador Richard Hooker, professor de
Civilizações Antigas da Universidade do Estado de Washington, nos Estados
Unidos. A cidade, que até então era bem modesta e submetida a outro povo, ganhou
importância.
O
grande nome do período paleobabilônico foi o de Hammurabi (1792-1750). Dono de grandes
habilidades políticas e militares, ele não só ampliou as fronteiras da
Babilônia como também elaborou um código de leis que é até hoje citado como um
dos principais da história, escrito em uma estela de diorito negro. A Babilônia
ocupava então o que hoje são os territórios do sul do Iraque e da Síria.
A justiça e a definição do direito eram tão importantes que estão bem documentados nos milhares de tabletes de argila descobertos nos sítios arqueológicos da Mesopotâmia, embora a maior parte deles seja de caráter contábil-administrativo. Muito da história dos antigos babilônicos, aliás, deve-se ao fato de eles estarem entre os primeiros povos a usar a escrita, chamada de cuneiforme, que era feita com estiletes em argila mole.
"Nele
são evidenciados os princípios éticos e morais daquela sociedade e a dor e a
solidão dos homens diante do sofrimento e da morte", afirma Kátia Pozzer.
Os babilônicos não acreditavam em vida após a morte. Era preciso aproveitar o
mundo aqui.
Os
banquetes eram fartos e os convidados, extremamente bem recebidos. "Havia
uma conduta apropriada para a recepção de um convidado, segundo os hábitos da
época: troca de apresentações e de palavras amistosas, oferecimento de
vestimentas limpas e novas, unção do corpo com óleos perfumados e, claro,
bebida e comida em abundância.
No
decorrer do banquete era realizado um brinde que anunciava uma espécie de
duelo, que poderia ser uma disputa de oratória ou um enfrentamento armado, cujo
encerramento era, em princípio, pacífico", afirma Kátia.
Depois
da comida, mais diversão. Lutadores se enfrentavam, saltimbancos faziam
piruetas e músicos tocavam. "Ocasionalmente, eles mantinham relações
sexuais enquanto tocavam seus instrumentos", diz Kátia.
O Começo do Fim
A
morte de Nabucodonosor em 562 a.C. desencadeou um processo de declínio de um
império que jamais voltaria a se reerguer. Seu filho e sucessor Amel-Marduk
reinou por apenas dois anos antes de ser assassinado por seu cunhado
Neriglissar, que por sua vez morreu três anos mais tarde, e seu filho
Labashi-Marduk, que era provavelmente apenas uma criança, só foi aceito como
rei por algumas das cidades da Babilônia. Resultado: acabou morto em pouco mais
de um mês em uma conspiração por parte da nobreza do império.
Um
herói de guerra, sem sangue nobre, exigiu para si o trono. Era Nabonido, um
sujeito com um filho já crescido, Bel-shar-usur (citado na Bíblia como
Baltazar). Embora não tenha sido aceito logo de cara por algumas cidades do
império, ele se mostrou um ótimo articulador político: tratou de mandar a filha
para ser sacerdotisa do deus da lua Sin na cidade de Ur e reconstruiu um
importante templo em Harran, na Síria.
Nabonido
resolveu estreitar ligações com os árabes e mudou-se para o norte da península
Arábica por dez anos. Deixou seu filho Bel-shar-usur como governante na
Babilônia.
Na
mesma época, os persas emergiam na região. Exércitos das duas potências
enfrentaram-se em vários locais até que Ciro, o rei persa, conquistou a capital
e capturou o rei Nabonido. Ciro libertou os descendentes dos antigos hebreus
expulsos de Jerusalém por Nabucodonosor e declarou seu próprio filho,
Cambisses, como rei da Babilônia.
"Porém,
depois de um ano o negócio foi desfeito e os territórios da Babilônia viraram
uma vasta província sob o governo persa", escreveu Paul Collins. "O
centro do mundo oriental transferiu-se para Susa, a capital persa", afirma
Hooker.
Por
volta de 332 a.C., Alexandre, o Grande queria a Pérsia, governada pelo rei Dario. Quando
Alexandre chegou à Babilônia, foi recebido como um herói - os habitantes da
região não aguentavam mais as humilhações sofridas durante o domínio persa, que
incluiu a destruição dos símbolos sagrados. Foi na Babilônia que Alexandre
morreu, acredita-se que de virose. E com o tempo o próprio império teria o
mesmo destino.
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